sábado, 14 de abril de 2012

GEA - Grupo de Estudos Avançados do Complexo Damásio de Jesus

Um novo estudo do Grupo GEA - Grupo de Estudos Avançados do Complexo Damásio de Jesus foi publicado . Trata-se de um estudo acerca da influência da Teoria de Hans Kelsen nos Tribunais Superiores. Abaixo, reproduzimos o comentado artigo.


A influência de Hans Kelsen nas decisões dos tribunais brasileiros


Pelo menos na órbita dos tribunais, a teoria pura do direito de Hans Kelsen não está ultrapassada. O estudo da sua obra nas Faculdades e Cursos de Direito é plenamente justificável.

Resumo: O presente artigo é resultado de uma breve pesquisa acerca do uso da Teoria Pura do Direito como fundamento de decisões dos Tribunais brasileiros. Partindo da análise de decisões, efetuou-se um levantamento dessas, tanto monocráticas, quanto colegiadas. Não se buscou, neste breve estudo, uma pesquisa comparativa entre a teoria kelseniana e as demais teorias do direito; mas apenas verificar se aquela ainda sustenta decisões das mais importantes cortes de julgamento de nosso país. 

Palavras-chave: Teoria Pura do Direito, Hans Kelsen, Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça, Normativismo Jurídico, Norma-Hipotética Fundamental.

Sumário: 1. Introdução. 2. A neutralidade proposta por Hans Kelsen. 3. Sistema e estrutura. 4. Hans Kelsen e os tribunais brasileiros. 5. Conclusão. 6. Bibliografia.

1. INTRODUÇÃO

É possível encontrar, no âmbito do Poder Judiciário, muitas decisões que se fundamentam de forma explícita ou implícita na Teoria Pura do Direito, neste último caso pela citação de juristas que adotam tal teoria. Neste artigo optamos por mostrar algumas decisões que se fundamentam explicitamente na citada obra de Hans Kelsen. Para compreender as ementas destas decisões, vamos expor, sucintamente, as principais noções da teoria kelseniana que ainda repercutem nos Tribunais.  

Kelsen, na Teoria Pura do Direito, elege a autonomia da ciência jurídica como problema fundamental da sua tese e confere-lhe método e objeto próprios, capazes de assegurar ao jurista o conhecimento científico do direito. Para isto estabelece um princípio metodológico, o princípio da pureza, com o qual pretende reduzir a complexidade do objeto do direito ao afastar da ciência jurídica as ingerências intrusas, potencialmente perturbadoras, de ordem epistemológica e axiológica.

Para Kelsen, o direito é um complexo de normas jurídicas emanadas do poder soberano (autoridades competentes). Esse complexo de normas constitui o objeto de estudo da ciência jurídica, e a tarefa do jurista consiste em descrever e sistematizar esse objeto mediante proposições.  

 

2. A NEUTRALIDADE PROPOSTA POR HANS KELSEN

De acordo com Kelsen, o conhecimento jurídico, para ser científico, deve ser neutro, portanto, não cabe ao jurista fazer julgamentos nem avaliações sobre as normas. No exercício de sua atividade, o jurista deve afastar tanto as dimensões axiológicas, que implicam em proferir juízos de valor a respeito das normas, como as dimensões epistemológicas, que implicam motivações específicas de outras ciências. Essas dimensões comprometeriam a verdade das proposições que o jurista enuncia sobre as normas. 

O raciocínio jurídico não deve versar sobre o que é certo ou errado, justo ou injusto, adequado ou inadequado, mas sim, sobre o válido e o inválido, o lícito e o ilícito, o legal e o ilegal.

Desse modo, é sempre possível que uma norma, indubitavelmente injusta, inadequada e inconveniente, quando submetida ao modelo teórico kelseniano possa ser considerada legal, válida e eficaz. Esse resultado é possível devido à forma como Kelsen racionalizou a estrutura do sistema jurídico.


3. SISTEMA E ESTRUTURA

Para Kelsen, o sistema jurídico é, fundamentalmente, um conjunto de normas jurídicas válidas, dispostas numa estrutura hierarquizada. Norma jurídica válida é aquela emanada de um órgão (autoridade) que possui competência para editar normas. A competência do órgão é determinada por outras normas de hierarquia superior. Estrutura é, desse modo, um conjunto de relações estabelecidas conforme regras de subordinação (vínculos verticais) e de coordenação (vínculos horizontais).

Conforme Paulo de Barros Carvalho (1993: 84), examinando o sistema de baixo para cima, cada unidade normativa se encontra fundada, materialmente e formalmente, em normas superiores. Invertendo-se o prisma de observação, verifica-se que das regras superiores derivam, materialmente e formalmente, regras de menor hierarquia.

Entretanto, fundamentar a norma em outra que lhe é superior traz ao sistema uma regressão ao infinito. Segundo Olney Queiroz Assis (2010:3), para garantir a racionalidade da ordem jurídica, tem-se na Teoria Pura a noção de norma hipotética fundamental, no sentido de primeira norma transcendental. É uma norma suposta, vale dizer, não é editada por um ato de autoridade, não possui um conteúdo, é uma exigência lógica, uma proposição axiomática ou apenas uma ficção que sustenta o fundamento de validade da ordem jurídica, evitando uma regressão ao infinito ou à discussão (sociológica, política, filosófica) sobre a legitimidade do poder originário ou a existência de outras fontes normativas não especificadas nas normas emanadas das autoridades competentes. À norma hipotética fundamental que é suposta, segue-se a primeira norma posta que, no caso do Brasil, corresponde ao conjunto normativo da Constituição Federal. 

A validade da norma repousa na competência normativa de seu editor, que é conferida por outra norma e assim, sucessivamente, numa série finita que culmina na norma fundamental. Essa estrutura possibilita ao jurista organizar o sistema dinâmico de normas relacionando-as a partir de regras de competência, reguladoras da produção normativa e, portanto, das constantes mutações do ordenamento jurídico. Enfim, a competência para editar uma norma fundamenta-se em outra norma imediatamente superior àquela que será editada.

Da mesma maneira organiza-se o sistema estático, relacionando as normas a partir de seus conteúdos. Verificando se os conteúdos das normas inferiores são compatíveis com os das normas superiores. A norma emanada de quem possui competência para editá-la deve manter conteúdo compatível com a norma que lhe é imediatamente superior. 

Esse modelo, exposto de forma resumida, embora não seja isento de objeções, tem servido de apoio a diversas decisões dos tribunais.  

4. HANS KELSEN E OS TRIBUNAIS BRASILEIROS

A noção de sistema jurídico como uma estrutura escalonada ou hierarquizada de normas, tanto no aspecto estático quanto no aspecto dinâmico, é amplamente aceita pela doutrina e pelos tribunais, conforme se lê nas seguintes decisões:

1. Nesta decisão o Tribunal reconhece que a estrutura hierarquizada de normas penetrou os segmentos da jurisprudência e doutrina no Brasil:
“Com base no dogma da hierarquia normativa, cujas raízes lógicas e axiológicas remontam aos célebres trabalhos do notável jurista austríaco HANS KELSEN (1881-1973), os Juristas afirmam, sem discrepâncias de tomo, que a produção normatizadora da vida jurídica e social do País se faz por meio de autêntica escala de instrumentos reguladores, em sentido decrescente, a partir da Constituição: as emendas constitucionais, as leis complementares, as leis ordinárias, as medidas provisórias e dos decretos legislativos (art. 59 da CF). (REsp 926011 / DF RECURSO ESPECIAL 2007/0032125-0. Relator(a) Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA (1128). Data da Publicação/Fonte  DJe 09/12/2008).

2. Nesta decisão o Tribunal reconhece que uma norma jurídica se fundamenta em outra que lhe é imediatamente superior:
“Julgados plúrimos, do Egrégio STJ, em cuja esteira houve vários outros, nesta Corte, no sentido de que tais portarias, que guardam menor hierarquia no cotejo dos Decretos-Lei 2283 e 2284/1986, não poderiam ter excepcionado a regra do citado plano econômico que visou o alcance da estabilidade monetária. Pirâmide das normas, que Jurisprudência/STJ - Decisões Monocráticas aqui se recorda, no precioso escólio de Hans Kelsen. Ilegalidade manifesta, como também inconstitucionalidade, das normas de hierarquia mais baixa, tanto à luz da Carta de 1988, quanto da que vigorava naquele tempo; de 1967/1969 (Processo REsp 1087093. Data da Publicação DJe 04/03/2009)

3. A Corte Superior leciona nesta decisão a validade quando inserida no sistema jurídico:
“Em outros termos, o comando normativo encontra validade exclusivamente quando apreciado como fração de sistema, relacionado a este, conforme lecionam Hans Kelsen e Norberto Bobbio, entre outros mestres” (STJ. Processo REsp 1095537. Data da Publicação DJe 16/12/2009;

4. No Recurso Especial 122108 de 03 de fevereiro de 2011 o Superior Tribunal de Justiça fundamentou sua decisão em Hans Kelsen sustentando que:
“Cita-se, por oportuno a lição de Hans Kelsen, quanto à hierarquia de normas, impondo a estreita abrangência da norma inferior, face ao conteúdo e comando de norma superior, de forma a permitir a normatização harmônica da situação jurídica que se pretenda ordenar (...)
Ainda que a prestação de serviços do nutricionista permita o enquadramento das refeições servidas aos trabalhadores às normas de segurança alimentar e nutricional da legislação vigente, a exigência não encontra respaldo legal, merecendo ser provido o apelo no ponto.
Ante o exposto, voto por dar provimento ao apelo”.

5. Em publicação do dia 05 de março de 2010, nos autos do Recuso Especial 1.133.497 RN, a corte assim fundamentou:
Nesta esteira, aceitar a aplicação da Lei de Improbidade Administrativa em desfavor dos agentes políticos (magistrados) é subverter a própria característica piramidal do sistema jurídico brasileiro, a qual nos é ensinada por Hans Kelsen, ou, ainda, andar na contra-mão de sistema jurídico vigente, o qual obedece uma jurisdição escalonada composta de tribunais de segundo grau, tribunais superiores e Supremo Tribunal, admitindo-se, até mesmo, que um juiz de primeiro grau possa aplicar, por exemplo, a pena de perda do cargo a um magistrado de uma instância superior, ante a previsão de imposição da referida sanção na lei ora rechaçada.

6. Com as mesmas fundamentações do anterior, os Recursos Especiais 1175060, 1095537, 1087093.
Enfim, conforme demonstrado, as decisões acima constituem apenas uma pequena amostra de um universo bem mais amplo, ao qual o leitor poderá verificar nos sites dos diversos tribunais do País.     

5. CONCLUSÃO

Após a análise de vários acórdãos, concluímos que, embora não seja a única teoria jurídica a sustentar decisões dos Tribunais, a Teoria Pura ainda é muito usada de forma implícita ou explícita pelos julgadores das mais altas instâncias do Poder Judiciário.

Aliás, Tercio Sampaio Ferraz Jr (in Coelho: 1995: 19) anota que “a obra de Kelsen ainda o mantém vivo. Suas implicações para a ciência jurídica, para a lógica da norma, para a aplicação do direito são tão fecundas, que, por mais que o critiquemos, não deixam de desvendar novos ângulos, novos encaminhamentos”.    

Diante dessa realidade, cabe aos profissionais do direito (advogados, juízes, promotores) reconhecê-la e perceber que, pelo menos na órbita dos Tribunais, Kelsen não está ultrapassado. Nesse sentido, o estudo da sua obra nas Faculdades e Cursos de Direito é plenamente justificável.

6. BIBLIOGRAFIA

ASSIS, Olney Queiroz, KUMPEL, Vitor Frederico e ASSIS, Ana Elisa Spaolonzi Queiroz (2010). Manual de Sociologia Geral e Jurídica. São Paulo. Método
CARVALHO, Paulo de Barros (1993). Curso de Direito Tributário. Saraiva. São Paulo.
COELHO, Fabio Ulhoa (1995). Para Entender Kelsen. São Paulo. Max Limonad.
FERRAZ JR, Tercio Sampaio (1995). Introdução ao Estudo do Direito. São Paulo. Atlas.   
KELSEN, Hans (1976). Teoria Pura do Direito. Coimbra. Armênio Amado.    



Abstract: The presented article is the result of a brief research on the use of the Pure Theory of Law as a grounding for decisions of our courts. Based on the analysis of decisions, a levy of these was performed, both monocratic, and collegiate. No attempt was made in this brief study to compare Kelsen's theory and other theories of law, but only to verify if that still holds decisions of the most important trial courts of our country.

Key words: Pure Theory of Law, Supreme Federal Court, Superior Court of Justice, Hans Kelsen, Legal Normativism, Hypothetical Basic Norm.


quinta-feira, 5 de abril de 2012

Direito de Familia

É cabível exigir prestação de contas do cônjuge que geriu os bens comuns após a separação

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a obrigação do cônjuge que conserva a posse dos bens do casal de prestar contas ao outro no período entre a dissolução da sociedade conjugal e a partilha. A decisão baseou-se em entendimento do relator, ministro Villas Bôas Cueva. “Aquele que detiver a posse e a administração dos bens comuns antes da efetivação do divórcio, com a consequente partilha, deve geri-los no interesse de ambos os cônjuges, sujeitando-se ao dever de prestar contas ao outro consorte, a fim de evitar eventuais prejuízos relacionados ao desconhecimento quanto ao estado dos bens comuns”, afirmou o relator. O processo diz respeito a um casamento em regime de comunhão universal de bens contraído em 1968. O casal separou-se de fato em 1º de janeiro de 1990. Por mais de 15 anos, os bens do casal ficaram sob os cuidados do homem, até a partilha. A ex-mulher ajuizou ação de prestação de contas para obter informações sobre os bens conjugais postos aos cuidado do ex-marido. A sentença julgou procedente o pedido de prestação de contas. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve o entendimento, explicando que o ex-marido ficou na condição de administrador, cuidando dos interesses comuns, com a obrigação de gerir os interesses de ambos até a partilha. Por isso, ele teria o “dever de detalhar e esclarecer os rendimentos advindos das terras arrendadas, bem como prestar as respectivas informações quanto ao patrimônio comum”. No recurso ao STJ, o ex-marido alegou a inviabilidade do pedido de prestação de contas, porque isso “exige a administração de patrimônio alheio”. No caso, disse a defesa, os bens são mantidos por ambas as partes, e cada cônjuge ostenta a condição de comunheiro, de modo que ele administra  patrimônio comum do qual é titular simultaneamente com a ex-mulher. Em seu voto, o ministro Villas Bôas Cueva definiu que a prestação de contas serve como um mecanismo protetor dos interesses daquele cônjuge que não se encontra na administração ou posse dos bens comuns. O ministro esclareceu que, nocasamento em comunhão universal, os cônjuges não estão obrigados ao dever de prestar contas dos seus negócios um ao outro, haja vista a indivisibilidade patrimonial. Entretanto, quando efetivamente separados – com a separação de corpos, que é o caso – e antes da formalização da partilha, quando os bens estiverem sob a administração de um deles, “impõe-se reconhecer o dever de prestação de contas pelo gestor do patrimônio em comum”.
Revista Jus Vigilantibus, Terça-feira, 3 de abril de 2012

domingo, 1 de abril de 2012

Direito Tributário - Cancelamento de Débito

MF cancela débitos inscritos em dívida ativa de valor até R$ 100,00

O Ministério da Fazenda, através da Portaria 75 MF/2012, publicada no Diário Oficial de hoje, 26-3, estabelece novos limites para inscrição de débitos fiscais na Dívida Ativa da União.
De acordo com este Ato, serão cancelados os débitos inscritos na Dívida Ativa da União quando o valor consolidado remanescente for igual ou inferior a R$ 100,00, assim como os saldos de parcelamentos concedidos no âmbito da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional ou da Receita Federal, cujos montantes não sejam superiores aos valores mínimos estipulados para recolhimento por meio de documentação de arrecadação.
Valor consolidado do débito é aquele resultante da atualização do respectivo débito originário, somado aos encargos e acréscimos legais ou contratuais, vencidos até a data da apuração.
A Portaria também determina a não inscrição na Dívida Ativa de débito de um mesmo devedor de valor consolidado igual ou inferior a R$ 1.000,00 e o não ajuizamento de execuções fiscais de débitos com a Fazenda Nacional, cujo valor consolidado seja igual ou inferior a R$ 20.000,00. Esses limites não se aplicam quando se tratar de débitos decorrentes de aplicação de multa criminal.

Presunção de violência contra menor de 14 anos em estupro é relativa

     

Divulgação/Internet
Presunção de violência contra menor de 14 anos em estupro é relativa
Para a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a presunção de violência no crime de estupro tem caráter relativo e pode ser afastada diante da realidade concreta. A decisão diz respeito ao artigo 224 do Código Penal (CP), revogado em 2009. 

Segundo a relatora, ministra Maria Thereza de Assis Moura, não se pode considerar crime o ato que não viola o bem jurídico tutelado – no caso, a liberdade sexual. Isso porque as menores a que se referia o processo julgado se prostituíam havia tempos quando do suposto crime. 

Dizia o dispositivo vigente à época dos fatos que “presume-se a violência se a vítima não é maior de catorze anos”. No caso analisado, o réu era acusado de ter praticado estupro contra três menores, todas de 12 anos. Mas tanto o magistrado quanto o tribunal local o inocentaram, porque as garotas “já se dedicavam à prática de atividades sexuais desde longa data”. 

Segundo o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), a própria mãe de uma das supostas vítimas afirmara em juízo que a filha “enforcava” aulas e ficava na praça com as demais para fazer programas com homens em troca de dinheiro. 

“A prova trazida aos autos demonstra, fartamente, que as vítimas, à época dos fatos, lamentavelmente, já estavam longe de serem inocentes, ingênuas, inconscientes e desinformadas a respeito do sexo. Embora imoral e reprovável a conduta praticada pelo réu, não restaram configurados os tipos penais pelos quais foi denunciado", afirmou o acórdão do TJSP, que manteve a sentença absolutória. 
Divergência 
A Quinta Turma do STJ, porém, reverteu o entendimento local, decidindo pelo caráter absoluto da presunção de violência no estupro praticado contra menor de 14 anos. A decisão levou a defesa a apresentar embargos de divergência à Terceira Seção, que alterou a jurisprudência anterior do Tribunal para reconhecer a relatividade da presunção de violência na hipótese dos autos. 

Segundo a ministra Maria Thereza, a Quinta Turma entendia que a presunção era absoluta, ao passo que a Sexta considerava ser relativa. Diante da alteração significativa de composição da Seção, era necessário rever a jurisprudência. 

Por maioria, vencidos os ministros Gilson Dipp, Laurita Vaz e Sebastião Reis Júnior, a Seção entendeu por fixar a relatividade da presunção de violência prevista na redação anterior do CP. 
Relatividade 
Para a relatora, apesar de buscar a proteção do ente mais desfavorecido, o magistrado não pode ignorar situações nas quais o caso concreto não se insere no tipo penal. “Não me parece juridicamente defensável continuar preconizando a ideia da presunção absoluta em fatos como os tais se a própria natureza das coisas afasta o injusto da conduta do acusado”, afirmou. 

“O direito não é estático, devendo, portanto, se amoldar às mudanças sociais, ponderando-as, inclusive e principalmente, no caso em debate, pois a educação sexual dos jovens certamente não é igual, haja vista as diferenças sociais e culturais encontradas em um país de dimensões continentais”, completou. 

“Com efeito, não se pode considerar crime fato que não tenha violado, verdadeiramente, o bem jurídico tutelado – a liberdade sexual –, haja vista constar dos autos que as menores já se prostituíam havia algum tempo”, concluiu a relatora. 

O número deste processo não é divulgado em razão de sigilo judicial.
Fonte Revista Âmbito Jurídico

Direito Penal

Até que a lei seja alterada, apenas bafômetro e exame de sangue podem comprovar embriaguez de motorista
Em julgamento apertado, desempatado pelo voto de minerva da ministra Maria Thereza de Assis Moura, presidenta da Terceira Seção, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que apenas o teste do bafômetro ou o exame de sangue podem atestar o grau de embriaguez do motorista para desencadear uma ação penal. A tese serve como orientação para as demais instâncias do Judiciário, onde processos que tratam do mesmo tema estavam suspensos desde novembro de 2010.

De acordo com a maioria dos ministros, a Lei Seca trouxe critério objetivo para a caracterização do crime de embriaguez, tipificado pelo artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB). É necessária a comprovação de que o motorista esteja dirigindo sob influência de pelo menos seis decigramas de álcool por litro de sangue. Esse valor pode ser atestado somente pelo exame de sangue ou pelo teste do bafômetro, segundo definição do Decreto 6.488/08, que disciplinou a margem de tolerância de álcool no sangue e a equivalência entre os dois testes.

“Se o tipo penal é fechado e exige determinada quantidade de álcool no sangue, a menos que mude a lei, o juiz não pode firmar sua convicção infringindo o que diz a lei”, afirmou a ministra Maria Thereza ao definir a tese.

O julgamento teve início em 8 de fevereiro e foi interrompido por três pedidos de vista. Dos nove integrantes da Terceira Seção, cinco ministros votaram seguindo o ponto de vista divergente (contrário ao do relator) e vencedor. O desembargador convocado Adilson Macabu foi o primeiro a se manifestar nesse sentido e, por isso, lavrará o acórdão. Também acompanharam o entendimento, além da presidenta da Seção, os ministros Laurita Vaz, Og Fernandes e Sebastião Reis Júnior.

Estrita legalidade
Ao expor sua posição na sessão do dia 29 de fevereiro, o desembargador Macabu ressaltou a constitucionalidade da recusa do condutor a se submeter ao teste de alcoolemia (tanto o bafômetro quanto o exame de sangue), diante do princípio da não autoincriminação, segundo o qual ninguém está obrigado a produzir prova contra si mesmo.

Dada a objetividade do tipo penal (artigo 306 do CTB), o magistrado considerou inadmissível a possibilidade de utilização de outros meios de prova ante a recusa do motorista em colaborar com a realização de exame de sangue ou bafômetro.

Ele destacou que o limite de seis decigramas por litro de sangue é um elemento objetivo do tipo penal que não pode ser relativizado. “A lei não contém palavras inúteis e, em nome de adequá-la a outros fins, não se pode ferir os direitos do cidadão, transformando-o em réu por conduta não prevista em lei. Juiz julga, e não legisla. Não se pode inovar no alcance de aplicação de uma norma penal. Essa não é a função do Judiciário”, afirmou.

Qualidade das leis
O desembargador acredita que, na prática, há uma queda significativa na qualidade das leis. Mas isso não dá ao juiz o poder de legislar. “O trânsito sempre matou, mata e matará, mas cabe ao Legislativo estabelecer as regras para punir, e não ao Judiciário ampliar as normas jurídicas”, advertiu o desembargador. “Não se pode fragilizar o escudo protetor do indivíduo em face do poder punitivo do estado. Se a norma é deficiente, a culpa não é do Judiciário”, defendeu.

O ministro Og Fernandes também lamentou que a alteração trazida pela Lei Seca tenha passado a exigir quantidade mínima de álcool no sangue, atestável apenas por dois tipos de exames, tornando a regra mais benéfica ao motorista infrator. “É extremamente tormentoso para o juiz deparar-se com essa falha”, declarou. Mas ele conclui: “Matéria penal se rege pela tipicidade, e o juiz deve se sujeitar à lei.” A ministra Maria Thereza de Assis Moura, da mesma forma, lembrou que alterações na lei só podem ser feitas pelo legislador.

Caso concreto 
No recurso interposto no STJ, o Ministério Público do Distrito Federal (MPDF) se opõe a uma decisão do Tribunal de Justiça local (TJDF), que acabou beneficiando um motorista que não se submeteu ao teste do bafômetro, porque à época o exame não foi oferecido por policiais. O motorista se envolveu em acidente de trânsito em março de 2008, quando a Lei Seca ainda não estava em vigor, e à época foi encaminhado ao Instituto Médico Legal, onde um teste clínico atestou o estado de embriaguez.

Denunciado pelo MP com base no artigo 306 do CTB, o motorista conseguiu o trancamento da ação penal, por meio de um habeas corpus, sob a alegação de que não ficou comprovada a concentração de álcool exigida pela nova redação da norma trazida pela Lei Seca. O tribunal local entendeu que a lei nova seria mais benéfica para o réu, por impor critério mais rígido para a verificação da embriaguez, devendo por isso ser aplicada a fatos anteriores à sua vigência.

A decisão da Terceira Seção negou provimento ao recurso do MPDF. 
Fonte STJ

Direito do Trabalho

Médicos com dupla jornada têm direito a adicional por tempo de serviço dobrado
Médicos que optaram por jornada de trabalho de 40 horas semanais têm direito ao adicional por tempo de serviço calculado sobre os dois vencimentos básicos. A decisão é da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

No caso julgado, os servidores médicos da Universidade Federal de Santa Maria (RS) que optaram por jornada de trabalho de 40 horas semanais observaram, em maio de 2005, uma redução na remuneração, decorrente de alteração na interpretação da Lei 8.112/90 por parte da administração pública.

De acordo com o processo, a verba percebida pelos médicos tinha como base de cálculo a soma dos vencimentos básicos de ambas as jornadas, cada uma de 20 horas. Porém, desde maio 2005, o cálculo passou a ser apenas sobre um vencimento básico, correspondente à jornada de 20 horas semanais.

Os autores ajuizaram ação ordinária para garantir o direito aos respectivos adicionais por tempo de serviço, levando em consideração os vencimentos relativos às duas jornadas. Em primeiro grau, os pedidos foram julgados parcialmente procedentes.

O magistrado restabeleceu o pagamento integral da verba, bem como determinou que fossem pagas as diferenças relativas aos valores recebidos desde maio de 2005, com juros de mora em 0,5% ao mês. Contudo, a decisão ressalvou à administração a possibilidade de renovar o ato, desde que atendidas as formalidades necessárias.

Tanto os médicos quanto a universidade apelaram. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região negou o recurso dos funcionários e deu parcial provimento ao da instituição, reformando a sentença apenas quanto aos juros de mora.

Lei clara
Ainda insatisfeitos, os médicos interpuseram recurso no STJ alegando, entre outros fatores, a negativa da vigência ao artigo 1º da Lei 9.436/97. Essa lei determina que os servidores médicos, em princípio, têm jornada de trabalho de 20 horas semanais, porém faculta ao servidor a opção pelo regime de 40 horas semanais, exigindo que sejam respeitados os valores dos vencimentos básicos fixados legalmente.

A universidade interpôs recurso adesivo, argumentando que, embora a lei permita a jornada dupla de trabalho, o percentual referente ao adicional por tempo de serviço, em qualquer situação, incide sobre o vencimento básico, considerando apenas uma jornada.

Segundo a ministra Laurita Vaz, relatora dos recursos, a tese da administração “não reflete o bom direito”, pois a lei é clara ao estabelecer que o adicional por tempo de serviço “será calculado sobre os vencimentos básicos estabelecidos no anexo desta lei”, chegando à conclusão de que devem ser considerados os valores dos dois vencimentos básicos.

Assim, a Turma deu provimento ao recurso dos médicos e negou provimento ao recurso adesivo da universidade. A decisão detalhou a incidência dos juros, que deve ser feita da seguinte forma: percentual de 1% ao mês no período anterior a 24 de agosto de 2001, quando foi publicada a Medida Provisória 2.180-35; percentual de 0,5% ao mês a partir da referida MP até junho de 2009, quando a Lei 9.494/97 obteve nova redação; percentual estabelecido para caderneta de poupança a partir da Lei 11.960/09.

Já a correção monetária pelo INPC deverá contar do dia em que cada parcela deveria ter sido paga. Os honorários advocatícios foram fixados em 5% sobre o valor da condenação.
Fonte STJ

segunda-feira, 26 de março de 2012

Dignidade Humana

Passageira de ônibus será indenizada por ficar presa na roleta

A empresa de transportes Zona Oeste, responsável pelas linhas de ônibus que atendem a Avenida Brasil, foi condenada a pagar uma indenização no valor de R$ 12 mil, por danos morais, a uma passageira obesa. Fernanda Oliveira teve vários hematomas na barriga e uma crise de pressão alta após ficar presa durante 30 minutos na roleta do ônibus 1311 (Castelo – Santa Cruz), de responsabilidade da ré, necessitando ser medicada no Hospital Souza Aguiar, no Centro. A autora, usuária da linha diariamente, alega que enquanto aguardava o socorro do Corpo de Bombeiros, foi alvo de zombarias e de chacotas dos demais passageiros, que a xingaram de “bolo fofo” e “gordona”. Em sua decisão, o desembargador Mario Robert Mannheimer, da 16ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, afirma que a empresa foi omissa, pois a situação de pessoas com excesso de peso é semelhante à de gestantes. “A apelante não conduziu o ingresso da apelada por outra via, como seria seu dever. Além disso, ficou claro que os prepostos da apelante fizeram-lhe zombarias, bem como outras pessoas que se amontoavam para observar a cena. Também ficou comprovado que o estado emocional da apelada foi severamente abalado, a tal ponto que precisou de atendimento médico, em função da alta da pressão arterial, conforme confirmado pelo boletim do Corpo de Bombeiros. E, ainda que assim não fosse, a autora ficou, pelo menos, meia hora presa à roleta, razão pela qual, não seria preciso qualquer comprovação do aumento da pressão arterial para avaliar o mal-estar físico que sentiu, sem prejuízo da angústia e vexame amargurados”, explicou o magistrado. Nº do Processo: 0391659-34.2008.8.19.0001.
FonteJusvi.com